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terça-feira, 26 de agosto de 2008

Introdução à Indústria Cultural e Indústria Cultural e a Moda

Não há comunicação ou moda ingênua. Os itens da comunicação, enquanto estímulos, são produzidos por nós com a finalidade de moldar ou dirigir o comportamento numa direção específica. Não nos vestimos apenas para cobrir o corpo, ou nos comportamos de certa maneira sem qualquer razão aparente. Estamos sempre fazendo uso de meios – sinais, signos e símbolos – para atingir certos fins. Sendo relevante lembrar que tais meios de forma alguma são automáticos, mecânicos. Um divertido exemplo é a moda brasileira de biquínis fio-dental. Tal signo, natural e apreciado nas praias brasileiras seria encarado de forma quase ultrajante em praias dos EUA. Isso nos mostra que os meios de forma alguma são universais, podendo nos levar a diferentes fins, dependendo apenas da interpretação do receptor. As situações de comunicação e de moda dependem da totalidade de fatores culturais e da personalidade que cada pessoa leva para a situação, levantando outra questão: a do individualismo. Ou seja , uma relativa liberdade deixada ás pessoas para rejeitar, modular ou aceitar as linguagens impostas. No entanto, tal liberdade individual de escolha, é indiretamente manipulada pelos diversos veículos de comunicação existentes no século XX, assunto abordado logo a seguir.

Com o surgimento de novas tecnologias (televisão, rádio) capazes de fazer com que meios de comunicação atingissem um público maior (massa), criou-se o termo comunicação de massa que vem acompanhado do conceito de indústria cultural. O primeiro tem significado literal, já o segundo quer dizer: a produção de bens de consumo simbólicos que são favorecidos pelo interesse da mídia através dos grandes veículos .
Daí, surge a "moda" que conhecemos hoje, onde, através da comunicação de massa, vendem-se costumes pré-fabricados que acabam por se tornar necessidade de todos. Ou seja a indústria cultural especula sobre o estado de consciência e inconsciência de milhões de pessoas, fazendo das massas mero elemento de cálculo. Hoje, a indústria cultural abusa da consideração com relação as massas para reiterar, firmar e reforçar a mentalidade destas, sendo que as massas não são a mentalidade mas a ideologia da indústria cultural, ainda que esta última não possa existir sem a elas se adaptar.
"A sociedade de consumo é a programação do cotidiano: ela manipula e quadricula racionalmente a vida individual e social em todos os seus interstícios; tudo se torna artifício e ilusão a serviço do lucro capitalista e das classes dominantes."
( Gilles Lipovetsky, O Império do Efêmero)

No entanto, em nossos dias, a autonomia pessoal na indumentária tem de ser levada em conta. Por mais que sigamos uma maré de tendências estabelecidas a cada estação, nos vestimos cada mais para si, em função de nossos próprios gostos, refletimos apenas a tendência que nos agrada transformando ,de forma sutil, as imposições da indústria cultural que não está ausente a esta mudança. Ora, o imperativo industrial da constante renovação ( Novo ) se encarna agora numa política de produtos coerente e sistemática, a da diversificação e desmassificação da produção. A moda hoje é despadronizada (diferente da produção em massa dos anos 50) e oferece através de um amplo leque de modelos e versões infinitas escolhas.

Longe de ser equivalente a uniformização dos comportamentos, dos usos, dos gostos, o império da moda caminha ao lado da personalização dos indivíduos. Nas eras de costume, poucos eram os homens imitados , no entanto eram imitados em tudo. Hoje, copiamos características variadas num universo de mil, dez mil pessoas. Elementos que em seguida combinamos á própria natureza acentuando por fim nossa personalidade.

Porém essa comunicação-moda não nos leva apenas a feliz idéia de que finalmente somos todos seres livres expressando nossa convicções pessoais através do vestuário. A inquietude da comunicação em nossa sociedade fez com a solidão se torna-se um sentimento em massa. O número de pessoas que vivem sozinhas aumentou abruptamente noa últimos anos, o número de anúncios de encontro aumentou junto com os grupos e associações de pessoas que se sentem sós, a frustração pela falta de comunicação tornou-se um fenômeno dos tempos modernos. Um pouco por toda parte as pessoas se queixam de não serem ouvidas, de não poder exprimir-se. A liquefação das identidades sociais, a diversificação dos gostos, a exigência soberana de ser si próprio desencadeiam num impasse relacional, uma crise da comunicação. A troca formal, estereotipada é cada vez mais vez menos satisfatória. Quer-se uma comunicação livre, sincera e pessoal e quer-se a renovação em nossas relações. Não sofremos apenas com o ritmo e com a organização da vida moderna, sofremos por nosso apetite insaciável de realização privada, de comunicação, de exigências sem fim em relação ao outro. O reino consumado da moda pacifica o conflito social, mas aprofunda o conflito subjetivo e inter-subjetivo; permite mais liberdade individual, mas engendra mais dificuldade de viver. A euforia da moda, tem como complemento o abandono, a depressão, a perturbação existencial. Há mais estimulações de todo o gênero, mais inquietude de viver, há mais autonomia privada, mas mais crise íntimas.
"Tal é a grandeza da moda, que remete sempre mais o indivíduo para si mesmo; tal é a miséria da moda que nos torna cada vez mais problemática para nós mesmos e para os outros."
( Gilles Lipovetsky, O Império do Efêmero)

Agora, o que importa é, sem dúvida, unir todos os esforços para o estudo das causas técnicas, científicas, econômicas e sociais que aceleram a evolução do mundo moderno, e para a previsão de situações que poderiam derivar das influências conjugadas. Pois não é ao redor do homen, mas nele mesmo que se impões as situações decisivas. Não adianta separar a moda com uma eferemidade e partir para assuntos que saboreiem o intelecto mais profundo, estamos absortos na forma moda ( o efêmero tambem faz parte de nossa essência), num mundo de fantasias onde a realidade se confunde, se perde e é seduzida por um homem "antenado", moderno e sozinho.



Flávia Vasconcelos de Mendonça
flavimoda@dominiofeminino.com.br
01, Junho/2002

História da Moda


É importante para o melhor entendimento desta análise descrever em pequena prévia o surgimento e estabelecimento da moda até os dias atuais:
Como já foi dito anteriormente, a moda caminha de forma oposta à lógica da tradição, ou seja há uma relativa depreciação do passado e a novidade é vista como algo superior, contrariando à tradição, onde o conservadorismo rege a lei da imobilidade através de uma continuidade social. Nas sociedades primitivas, a imposição de modelos herdados do passado impedem o aparecimento da moda.

"Enquanto nas eras de costumes reinam o prestígio da antigüidade e a imitação dos ancestrais, nas eras da moda dominam o culto das novidades assim como a imitação dos modelos presentes e estrangeiros. Prefere-se ter semelhanças com os inovadores contemporâneos do que com os antepassados."
( Gilles Lipovetsky, O Império do Efêmero)

Contudo, há um primeiro momento onde acontece um relativo abandono às normas coletivas que valorizam o legado ancestral, dando princípio à iniciativa estética, ao devaneio e à originalidade humana. Com o desuso da longa sobrecota em forma de blusão em proveito de um traje masculino mais curto, apertado na cintura, fechado por botões e descobrindo as pernas, modeladas em calções, e com o ajuste dos trajes femininos colocando em evidência o busto, os quadris e a curva das ancas, começa-se um ritmo precipitado de frivolidades, instalando o "reino das fantasias" de maneira sistemática e durável que se impõe durante cinco séculos. Este período que vai da metade do século XIV à metade do século XIX é considerado a fase inaugural da moda, momento onde esta revela seus traços sociais e estéticos mais característicos. Ou seja, a diferenciação social, a renovação das formas, o prazer em ornamentar-se, necessidade de ver e ser visto, apreciação do belo e liberdade individual na escolha das cores e cortes. Contudo, apenas grupos muito restritos que monopolizavam o poder de iniciativa e de criação tiveram acesso a este período. Trata-se do estágio aristocrático e artesanal da moda.

Porém, foi ao longo da segunda metade do século XIX que a moda, no sentido moderno do termo, instalou-se. Com os processos tecnológicos em todas as áreas, a moda viveu até 1960 um período que Lipovetsky chama de "moda de cem anos": fase em que o sistema começa a se fragmentar e a se readaptar parcialmente, e época do surgimento de grandes costureiros como Mme. Coco Chanel , Charles Worth e Paul Poiret. Há o surgimento de duas vertentes, a Alta Costura que se baseia na criação de luxo e sob medida, considerada o laboratório das novidades ( lançadores de tendências ), e a Confecção que é a produção em massa a um custo mais baixo e menor qualidade ( seguidores de tendência ). A moda agora passava a produzir burocraticamente coleções sazonais com uma lógica serial industrial e desfiles de manequins com fins publicitários.
Mas, o que realmente interessa neste período é que a moda se torna objeto de desejo, onde o vestuário converte-se em concretizador de emoções, traços de personalidade e caráter. Não que desde o princípio, a indumentária não tenha tido este mesmo efeito, mas no século XX, a moda moderna, além de suas novas características estético-burocrática, industrial , democrata e individualista, também, se torna elemento chave na comunicação visual em massa. Particularmente, a Alta Costura passou a ser uma dessas instituições que punham as pessoas (artistas, grandes costureiros, esportistas de sucesso e gente do "show bussines") no mais alto patamar, sacralizando seu estilo, fazendo com que sua individualidade fosse bajulada e desejada pelas massas. A moda passa a ser protagonista da indústria cultural.


"A Alta Costura é uma organização que, sendo burocrática, emprega não as tecnologias da coação disciplinar, mas processos inéditos de sedução que inauguram uma nova lógica do poder. (...)

A imposição estrita de um corte cedeu lugar a sedução da opção e da mudança, tendo como réplica subjetiva a sedução do mito da individualidade , da originalidade, da metamorfose pessoal, do sonho do acordo efêmero do Eu íntimo e da aparência exterior."
( Gilles Lipovetsky, O Império do Efêmero)

Dando fim a esse período de cem anos, surgiu em 1949 o prêt-a-porter (expressão desenvolvida por J.C. Weill que quer dizer "pronta para usar" — "ready to wear"), esta que revolucionou a lógica da produção industrial, pois agora era possível criar roupas em escala industrial , com maior qualidade e lançadoras de tendências. Ou seja, um mistura do glamour da Alta Costura ( que a princípio declinou com a chegada do prêt-a-porter ), com a eficiência da produção em série. Sem contar que a era do prêt-a-porter coincide com o fim da Segunda Guerra, onde o desejo de moda expandiu-se pelo cinema, através da multiplicação de revistas femininas, pelo baby boom que findou com poder de compra dos jovens, e pela vontade de viver o presente estimulada pela nova cultura de massa e consumo.

Junto ao prêt-a-porter, acontece outro fenômeno: já não se imita o superior, pelo contrário, imita-se o que se vê em torno de si, os trajes simples e divertidos, os modelos menos caros apresentados cada vez mais nas revistas. A lei vertical da imitação foi substituída por uma imitação horizontal, de acordo com uma sociedade de indivíduos reconhecidamente iguais. A influência da massa mediana é quem "comanda" a moda do final de século.
Flávia Vasconcelos de Mendonça
01, Junho/2002

Moda é a Comunicação

Centro da cidade, horário de almoço. A multidão trafega em avalanche. O sinal vermelho para os carros. Um pastor em seu terno barato anuncia a salvação. Panfleteiros atrapalham o caminho e contribuem com o monte de papéis inúteis no chão. Promoções fluorescentes de comida á quilo captam o olhar. Mendigos estendem as mãos. Garçons servem ocupados executivos ao celular. Um palhaço diverte os passantes...


O parágrafo acima ilustra diversas situações de comunicação que, nós produzimos e respondemos diariamente. Uma infinidade de sons, objetos e visões sem os quais a nossa existência seria impossível. A condição humana depende deste contato, contágio. Sendo impossível o sustento de qualquer cultura sem que haja a transmissão de alguma forma daquilo que se passa dentro de nós. Uma sociedade não se concretiza sem que os indivíduos se comuniquem através de quaisquer dos cinco sentidos que conhecemos cientificamente. O ser humano, simplesmente, não existe sozinho.


"Consideramos pois, a condição humana. Veremos que inclui: um equilíbrio biológico fundamental; um conjunto de relações dinâmicas entre os homens e seu meio material – relações estas que se manifestam mediante o desenvolvimento de técnicas; um conjunto de relações dos homens entre si, que caracteriza ao mesmo tempo a estática e a dinâmica da existência social; finalmente, um conjunto de formas de expressão de que se serve o homem, ao mesmo tempo, para tratar de dizer o que é e que faz, ou pelo menos, o que crê ser e fazer, e ipso facto, para ordenar, obrigar e, finalmente, compelir os outros e a si próprio.:" ( Cohen-Seat, Gilbert e Fougeyrollas, Pierre – "Introduction", in L’action sur l’homme: cinemá et television, Paris)
Dentro desta necessidade de comunicação está a Moda. "Com a moda começa o poder social dos signos ínfimos, o espantoso dispositivo de distinção social conferido ao porte das novidades sutis" ( Gilles Lipovetsky, O Império do Efêmero). A moda impera em todos os meios de comunicação da sociedade moderna. A partir do momento estamos fazendo uso de certa indumentária, adquirindo hábitos e nos transformando de diversas formas para se ajustar a realidade, estamos também produzindo e respondendo aos estímulos que nos rodeiam, estamos nos comunicando fazendo uso da moda.


Note que este fenômeno é exclusivo da civilização ocidental, pois é nesta que a Moda surge como sistema, onde as metamorfoses incessantes das formas e ornamentações transformam-se em valor mundano e a inconstância da indumentária passa a caminhar de forma oposta à lógica da tradição se fazendo regra permanente desde o final da Idade Média até os tempos de hoje. Com a moda, aparece uma primeira manifestação social que encarna um novo tempo legítimo e uma nova paixão própria ao Ocidente, a do "moderno".


Além disso, através da moda os seres passam a observar-se , avaliando as diferenças de corte, de cores, de motivos de indumentária e apreciam as aparências recíprocas. A moda liga-se ao prazer de ver e de ser visto, favorece o olhar crítico e estimula observações sobre a elegância dos outros, sendo assim, um completo investigamento de si.

Nesta análise a moda é vista, não apenas como meio de comunicação ativado no vestir, é importante deixar claro que a moda abrange em velocidades diversas outros campos como a arquitetura, a linguagem, as maneiras, os gostos e idéias e obras culturais. Com isso quero reconhecer o posto da informação visual no surgimento de um futuro radicalmente novo.
A afirmação do título "Moda é a Comunicação século XXI" se baseia nos dias de hoje, onde grande parte da informações que recebemos através dos grandes meios ( TV, rádio, jornais , revistas e Internet ) nos oferecem um universo da novidade, do lazer, do esquecimento e do sonho. A mídia tem o dever de informar, é claro, mas através do prazer, na renovação, no entretenimento.

Todas as transmissões com vocação cultural ou informativa devem adotam a perspectiva do lazer, só assim conseguem "abocanhar" um público mais numeroso. Para isso a ordem da sedução é prioritária, e é neste momento que a moda simplesmente se encaixa. No universo da mídia que constantemente é submetido aos recursos publicitários, é a forma Moda que organiza a produção e a difusão dos programas, que regula a forma, a natureza e os horários das transmissões. A Comunicação de hoje depende da moda para seguir seu rumo e a explosão numérica do audio-visual apenas aumenta tal competição que cada vez mais irá se firmar sobre o princípio da sedução. Além disso, é sobre os numéricos novos programas que será preciso exibir outros encantos, imaginar novas apresentações e novas fórmulas de prender a atenção. Mais do que nunca a pequena diferença, lei da moda, fará a sedução.


"Da mesma forma que a moda do século XVIII se pôs a brincar com grandes e pequenas coisas da história, a divertir-se em fitas e penteados com o sistema de Law, com as revoltas populares, com a derrota do Sena, hoje a informação não cessa em adota um estilo descontraído e lúdico em relação aos fatos do dia, o código humorístico fez passar o registro da informação para a lógica desenvolta e fantasiosa da moda". ( Gilles Lipovetsky, O Império do Efêmero)

Flávia Vasconcelos de Mendonça
flavimoda@dominiofeminino.com.br
01, Junho/2002

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Moda Contemporânea no Brasil: inquietação e reflexão




Moda Contemporânea no Brasil: inquietação e reflexão.
Por Nathalie Oliffson*



Durante todo o curso de Moda contemporânea, sempre senti uma certa inquietação quando tentava sair do panorama analítico global da moda para pensar a realidade do Brasil. Na minha opinião, os fenômenos de moda no Brasil, são, no mínimo, curiosos. O estilista Ronaldo Fraga, disse certa vez que "a moda no Brasil chegou ontem à tarde". É claro que não podemos desprezar a existência de uma história de moda no Brasil, mas ela não pode ser totalmente apreciada da mesma maneira como observamos os fenômenos na Europa e na América do Norte. E tão pouco a história de uma moda brasileira pode ser delineada igualmente.
Vejamos...Na época do Brasil colônia, após a chegada da corte portuguesa, as modas, e as tendências, seguiam os ditames e o timing das cortes Européias. A partir do século XX, especialmente da segunda metade, cada vez mais, a evolução das tecnologias da informação aceleraram esse timing. A informação hoje é instantânea, mas é uma informação periférica.
É impressionante o nível de ignorância, da falta de um saber de moda geral. Do consumidor, a inúmeros profissionais: empresários, estilistas, jornalistas e até professores (já que cursos de moda são a grande febre do mercado educacional). Esta triste realidade convive simultaneamente com o crescimento dos profissionais especializados e sua capacitação, claro. Enquanto isso, vamos convivendo com universos paralelos em dimensões diferentes. A questão da subjetividade da moda no Brasil se mostra especialmente mais complexa.
Chama a minha atenção, por exemplo o que passa pelo vocabulário de moda no Brasil. Nós temos as palavras moda, fashion e modinha. Seu significado e seu valor são diferentes de acordo com o lugar onde estamos. Modinha serve para definir aquilo que é tendência nas confecções mais populares. Naquelas onde "supostamente" o posicionamento é mais elevado é a palavra fashion que indica a parte tendência de uma coleção. E quando estamos num universo de criadores de moda, o que é tendência seria diferente do que é moda. Cito Chanel em sua ótima reflexão: "la mode c`est tout ce que se démodé" (a moda é tudo que deixa de ser moda).
Num país de tanta riqueza e pluralidade, tantos contrastes culturais, econômicos, sociais, climáticos, era de se esperar que a moda tivesse uma força também múltipla e forte. Entretanto, o que se percebe é que existe mais um movimento de uniformização de padrões do que de diferenciação e individualidade.
O brasileiro se mostra um grande consumidor de moda. Talvez seja uma herança dos índios e negros, que sempre adoraram se enfeitar. Entretanto, junto com esse desejo, existe uma certa "insegurança" ou fragilidade na manifestação dessa vontade. Percebo que à medida que o tempo foi passando que a sociedade foi supostamente, evoluindo, o consumidor brasileiro de moda foi buscando mais a uniformização do que a individualização ou um estilo próprio. Poderíamos afirmar que no Brasil ter estilo é seguir algum modelo (?!?)...Neste ponto é bem interessante tomarmos como exemplo os sucessos editoriais da década de 90 como os livros Chic - de Gloria Kalil - e Essencial - de Constanza Pascolato. Verdadeiros MANUAIS de moda. Ou ainda, a loucura de pessoas comuns para serem convidados para um desfile de moda.
A moda está na moda. E no Brasil, a grande ditadora de tendências de moda, e porque não dizer de comportamento é a Sra. Televisão. Os modelos seguidos, a definição do gosto, do que é feio ou belo, o que está na moda. O padrão é definido pela grande mídia brasileira, que entra gratuitamente todos os dia nos lares de todo o país.
Pensemos nas novelas ( o verdadeiro teatro do povo no Brasil - na definição de Chico Buarque ), especialmente nas novelas do horário nobre da Rede Globo, a maior emissora. Valem os exemplos da Dancin Days, com Júlia Mattos, personagem de Sônia Braga e suas meias de lurex. Ou ainda, mais recentemente, o estilo Jade, transportado para bijuterias e acessórios orientais, na novela O Clone. Ciente do seu poder, a Rede Globo hoje tem sua maior força comercial no licenciamento de produtos, que ela cria a cada sucesso na telinha se utilizando do recall de seus personagens e programas.
Interessante percebermos que nos exemplos acima citados, havia uma simultaneidade entre o figurino proposto, que virou moda, e a tendência da moda naquele momento. Mas o que dizer dos fenômenos de moda provocados por Roque Santeiro e sua Viúva Porcina, personagem de Regina Duarte. Segundo a figurinista Marília Carneiro, quando criou os exuberantes turbantes, seu objetivo era evidenciar a breguice da personagem. E aquilo virou in, para a maioria das mulheres brasileiras. Outro exemplo curioso foi na novela A Indomada, onde a personagem Zenilda, interpretada por Renata Sorah era dona de um bordel no interior do nordeste, na fictícia cidade de GreenVille. O figurino de suas "Camélias" era montado com roupas de griffes como Dior, Dolce Gabanna e Versace que estavam entrando no Brasil, naquele momento. O que impulsionou ainda mais o mau hábito copiador das confecções brasileiras.
Se pensarmos nos dias de hoje, vale ressaltar os nomes de dois novos programas de moda da televisão brasileira. O programa de Cristiana Arcangeli que se chama MANUAL, e no canal 21, o programa de Angelita Feijó, se chama TÁ NA MODA. Ou seja: do nome ao conteúdo, o objetivo é sempre reproduzir, se adequar, se encaixar.
E o consumidor brasileiro, ávido, vai absorvendo tudo, como uma esponja, sedento que é, criando um cenário de moda para lá de paradoxal. A insistência em se reproduzir tanto num país de tanta criatividade, me causa certa indignação.
Para atender a esse consumidor a indústria da moda também tem o hábito de reproduzir, na maioria das vezes, sem o menor constrangimento. Dois fenômenos atuais que chamam muito a atenção são a indústria da réplica e dos produtos alternativos. Não com a idéia de brincar, de criticar, mas com o comercial objetivo de faturar alto.

A palavra réplica se tornou uma definição "aceitável' da cópia descarada de produtos de griffe. Em um shopping zona sul de Belo Horizonte, pode-se comprar tranqüilamente réplicas de bolsas Dior, Gucci, Chanel e Louis Vuitton, que são apresentadas abertamente nas vitrines de determinadas lojas. Pelo preço "camarada" de R$ 800,00, R$ 900,00 reais a consumidora ávida de moda, pode se sentir incluída no grupo com uma bolsa falsificada, sem nenhum problema maior. Hoje, por exemplo, existe um grande mercado no setor de bijuterias que se entitulou de jóias alternativas. As empresas se especializaram em reproduzir em bijuterias, modelos das grandes joalheiras, e estão faturando alto. E, tudo isto vem acontecendo com a aquiescência inclusive da mídia respeitada. A revista Marie Claire, divulgou recentemente uma nota sobre uma ótica no Rio de Janeiro que tinha incríveis réplicas de óculos de griffe a preços camaradas.
Cientes da força da reprodução algumas empresas renomadas orientam suas equipes de vendas a utilizar o argumento para alcançar melhores resultados. Curioso por exemplo, uma experiência que vivenciei em uma loja da AREZZO onde a vendedora tinha um texto pronto para dizer - "Olha que modelo lindo, é exatamente a cópia da sandália da Prada".
Que moda brasileira é essa? Que cultura de moda é essa? Que consumidor de moda é esse? Que expressões e manifestações de moda vamos encontrando no Brasil?
Por isso a questão sobre uma identidade de moda brasileira, tenta ser tão discutida. Talvez levemos tempo para isso, o mesmo tempo necessário para se entender e apreciar a identidade brasileira.
A tarefa não é fácil, pois na maior parte das vezes, quem trabalha com moda, pouco sabe ou nada sabe sobre a moda. E esta realidade não compromete os resultados financeiros dos negócios de moda.
Um novo panorama passará, pela responsabilização da mídia e das escolas de moda, que devem ter profissionais capacitados trabalhando da disseminação da informação de moda e na formação dos futuros profissionais.
Nathalie Oliffson é assessora de imprensa em Belo Horizonte, além de radialista e aluna da pós-graduação online em Moda e Comunicação na Universidade Anhembi Morumbi.